Um dos problemas que mais se debatem hoje em todos os círculos, sociais, políticos, científicos, populares e acadêmicos, é o da violência. Mesmo porque, ele se atrela ao da criminalidade, embora não lhe corresponda exatamente. A esses debates não pode se furtar à psicologia jurídica ou psicologia forense, obviamente. As manifestações da violência podem ter suas implicações jurídicas, não só criminais, mas também em sede de justiça da família e da infância e juventude, assim como da sociedade em geral, já que a violência encontra um de seus mais importantes berços no próprio seio familiar. O assunto é por demais vasto. A violência, em si, poderia ser, como já tem sido, tema de eventos científicos.
Porém, o que nos interessa no presente capítulo é discutir alguns, reconhecidamente polêmicos, relativos ao tema da violência, particularmente questões relativas ao seu conceito e a sua origem no psiquismo e na conduta humana, para que possamos nos treinamentos de defesa pessoal, orientar melhor os policiais militares, contribuindo para a diminuição da violência policial na área operacional e até mesmo no relacionamento familiar, o que passamos a analisar os seguintes pontos:
2. Origem generalizada
Todo defeito do ente humano tem sua origem no ego. O ego é a causa de todo o mal. É responsável por toda amargura, tristeza e fracassos da raça humana. Portanto, depredação, da pichação, do uso das drogas e da violência generalizada, na escola, na família, nos campos de futebol, no trânsito, no exercício da função policial e na sociedade em geral, está inserida no ego, na forma de agregados psíquicos humano, em suas múltiplas formas mentais.
3. O ser humano é agressivo
Essa afirmação pode causar estranheza porque sempre conhecemos alguém que é muito bonzinho, “incapaz de fazer mal a uma mosca”. Neste caso, avalia-se a agressividade exclusivamente por suas manifestações: o comportamento. A pessoa “incapaz de fazer mal a uma mosca” é considerada como não agressiva, como não tendo nenhuma hostilidade (provocante, agressivo) dentro de si, nenhum impulso destrutivo na sua relação com as coisas e com outras pessoas.
Para superarmos a estranheza que a afirmação inicial causa é necessário compreender que a agressividade é o impulso que pode voltar-se para fora (heteroagressão) ou para dentro do próprio indivíduo (auto-agressão).
A agressividade sempre está relacionada com as atividades de pensamento, imaginação ou de ação verbal e não-verbal. Portanto, alguém muito “bonzinho” pode ter fantasias altamente destrutivas ou sua agressividade, pode manifestar-se pela ironia, pela omissão de ajudar, ou seja, a agressividade não se caracteriza exclusivamente pela humilhação, constrangimento ou destruição do outro, isto é, pela ação verbal ou física sobre o mundo.
A educação e os mecanismos sociais da lei e da tradição buscam a subordinação e o controle dessa agressividade. Assim, desde criança o ser humano aprende a reprimi-las e a não expressá-la de modo descontrolado, ao mesmo tempo em que o mundo da cultura cria condições para que o indivíduo possa canalizar, levar esses impulsos para produções consideradas positivas, como a produção intelectual, a produção artística, o desempenho esportivo e outras atividades consideradas sociais..
Nesse enfoque, cuja referência é a psicanálise, afirma-se que a agressividade é constitutiva do ser humano e, ao mesmo tempo, afirma-se a importância da cultura, da vida social, como reguladores dos impulsos destrutivos. Essa função controladora ocorre no processo de socialização, no qual espera-se que a partir de vínculos significativos que o indivíduo estabelece com os outros, ele passe a internalizar os controles. Então, deixa de ser necessário o controle externo, pois os controles já estão dentro do indivíduo. Mas, mesmo assim, em todos os grupos sociais existem mecanismos de controle e/ou punição dos comportamentos agressivos não valorizados pelo grupo. A sociedade tem seus mecanismos, que se concretizam na ordem jurídica; as leis.
Esse modo de compreende a agressividade humana coloca em questão se a sociedade está conseguindo ou não criar condições adequadas para a canalização da violência.
No entanto, a violência é o uso da agressividade, com fins destrutivos. Esse desejo pode ser:
a) voluntário (intencional), racional (premeditado e com objeto “adequado” da agressividade) e inconsciente.
b) Involuntário, irracional (a violência destina-se a um objetivo substitutivo, por exemplo, por ódio ao chefe, o individuo bate no filho, a polícia bate no cidadão) e inconsciente.
A agressividade está na constituição da violência, mas não é o único fator que a explica. É necessário compreender como a organização social (a PM) estimula, legítima e mantém diferentes modalidades de violência. O estímulo pode ocorrer tanto no incentivo à competição escolar e no mercado de trabalho como no incentivo a que cada um dos cidadãos dê conta de sua própria segurança pessoal. A legitimação pode ocorrer na guerra, no combate ao inimigo religioso, ao inimigo político. A manutenção da violência ocorre quando se conservam milhões de cidadãos em condições subumanas de existência, o que acaba por desencadear a prática de delitos associados à sobrevivência (roubar para comer, as prostituições precoces de crianças e jovens, dentre outros).
4 Tipos de Violência Imposta pela Máquina Estatal e o Sistema Econômico
A violência está presente também quando as condições de vida social são pouco propícias ao desenvolvimento e realizações pessoais e levam o indivíduo a mecanismos de autodestruição, como o uso de drogas, o alcoolismo, o suicídio.
Jurandir F. Costa, em seu livro Violência e Psicanálise, afirma que podemos entender como violência àquela situação em que o individuo “foi submetido a uma coerção (ato de constranger alguém a fazer alguma coisa) e a um desprazer absolutamente desnecessário ao crescimento, desenvolvimento e manutenção de seu bem-estar, enquanto ser psíquico (psiquismo: conjunto das características psicológicas de um indivíduo)”.
Isso significa que é necessário deixar de considerar como violência, exclusivamente, a prática de delitos, a criminalidade. Essa é uma associação feita, por exemplo, pelos meios de comunicação de massa (rádio, televisão e jornais) e que acabamos por reproduzir. Mas existem outras formas que não reconhecemos como práticas de violência e que estão diluídas no cotidiano, às quais, muitas vezes, já nos acostumamos, como a violência na família, na escola, no trabalho, do atendimento precário da saúde, das ruas, da polícia.
5 A Violência e suas Modalidades
Nos tempos modernos, a violência invadiu todas as áreas da vida de relação do indivíduo: relação com o mundo das coisas, com o mundo das pessoas, com seu corpo e sua mente. É como se o progresso tecnológico, o desenvolvimento da civilização, ao invés de propiciar o bem-estar dos indivíduos, concorressem para a deterioração das condições da vida social. A violência pode também, ser vista como patologia e doença social que acaba por “contaminar” toda a sociedade, mesmo aqueles grupos ou instituições consideradas como mais protetores de seus membros, como a família ou a escola.
Hélio Pollegrino, psicanalista brasileiro, afirma que a violência crescente só pode ser entendida a partir da constatação de que vivemos um momento histórico em que se rompeu o pacto social (o direito ao trabalho, por exemplo), e isso faz com que se rompa o pacto edípico, isso é, a autoridade, a norma, a lei internalizada. Essa ruptura retira o controle sobre os impulsos destrutivos, e esses afundam com sua força avassaladora.
Há um clima cultural no qual se observa a deterioração de valores básicos e agregadores da coletividade, tais como, a solidariedade, a justiça e a dignidade.
Hoje se constata a banalização do mal, da tolerância com a crueldade, da impunidade, da descrença do mecanismo regulador da convivência social – o sistema de justiça – e o fracasso do Estado em garantir a segurança dos cidadãos, até porque eles próprios descobrem que o Estado também detém a violência.
6. Ação e Reação
Estamos vivendo num mundo onde não existe mais padrão para a violência. Assassinato, roubo, agressão, assalto, seqüestro, estupro, tortura, estado de alerta o tempo todo, sobrevivência urbana, guerra civil não declarada entre classes, etc.
Vivemos num cenário de medo e insegurança, cercado de incerteza e injustiça. Ainda existe esperança e alegria, mas não dá para relaxar e viver sem ter a consciência dos riscos que corremos todos os dias.
É aí que entra o questionamento sobre a necessidade de conhecimento de algum tipo de defesa pessoal que nos traga autoconfiança e mais segurança. Porém, o mais importante que a defesa é a prevenção, saber evitar os riscos adotando certos procedimentos na rotina diária.
Sempre usamos como comparação à vida tranqüila dos índios, a harmonia com a natureza, a liberdade etc. Esquecemos que eles também têm que viver com cuidado para não serem surpreendidos pelos perigos naturais que os cercam. Não existe ignorância sobre a selva e as precauções que devem ser tomadas para viver em comunhão com plantas e animais. Eles não vivem com medo, mas temem e respeitam aquilo que pode causar dano ou trazer perigo. Nós também devemos respeitar a selva que habitamos, conhecer seus perigos e nunca supor que "isso não vai acontecer comigo".
Somos todos vítimas em potencial. Não existe treinamento que nos torne imortais ou invencíveis, porém nos traga autoconfiança e um pouco mais de segurança. O mais importante é manter a calma para controlar as ações ou reações.
Podemos comparar a violência urbana à cadeia alimentar:
Imagine que nós somos uma grande "manada" e que os "predadores" são os assaltantes. Eles buscam atacar àqueles que demonstram fraqueza ou pouca possibilidade de reação. Uma atitude ou postura firme, sem demonstrar pânico ou medo, pode salvá-lo de uma possível abordagem.
Evitar certos lugares em determinados horários e outros lugares a qualquer hora, não ostentar riqueza ou carregar muito dinheiro, prestar atenção à sua volta com discrição.
As técnicas de defesa pessoal vêm complementar como opção em uma situação extrema, onde se torne necessária uma atitude imediata e consciente. Por isso é que se fala tanto em filosofia na prática de artes marciais, pois a prática prepara para a reação física e a filosofia educa para as conseqüências. Isto é, havendo a necessidade e oportunidade de reagir e se estiver a ponto de lesionar gravemente seu agressor, se houver a dúvida entre machucar ou não, prevalecerá a decisão mais sensata para o momento.
Na selva de concreto não é só a violência física que nos afronta e sim a falta de respeito e amor ao próximo. Lembramos que ao optar pela prática de artes marciais ou defesa pessoal você não está se preparando para uma guerra, e sim procurando maior controle sobre si mesmo em todos os momentos difíceis, sejam de perigo ou simplesmente de decisão.
7. Técnicas para a Dissolução da Violência
Não se pode erradicar a violência da sociedade da forma como se tentou até hoje, atacando-a no efeito. É preciso atacá-la no seu nascedouro, na origem, na causa. E, para isso, precisamos saber onde ela nasce; coisa que a escola convencional não ensina às crianças. Não ensina porque não sabe. E não sabe porque não quer saber a verdade, a crua realidade dos fatos.
E por incrível que pareça, qualquer indivíduo pode erradicar de dentro de si mesmo os germes da violência, ou pelo menos neutralizá-los. Para isso a escola ou as pessoas compromissadas com a educação precisaria ter uma didática concreta, que orientasse o estudante a maneira correta da combater a violência na sua causa por meio da dissolução dos seus eus desumanos, do seu ego.
Para acabar com a violência social é preciso que os instrutores e professores ensinem aos seus alunos, seja crianças, adolescentes ou jovens que ainda não se tornaram demasiadamente violentos, a maneira como não se prostituírem socialmente com a violência generalizada do mundo dos adultos; a não se tornar violento, como mais uma vítima do sistema. E, é preciso ensinar, a quem já se contaminou com os vírus da violência, com os eus da ira, da ambição, da inveja, do orgulho, da preguiça, etc., a técnica de erradicação destes defeitos, por intermédio do sistema de revolução da consciência, que começa com a prática de auto-observação de si mesmo. É preciso saber e ter a coragem de ensinar que o ser humano é responsável pela violência social, pela violência familiar, racial, policial, etc., e, mostrar onde ela inicia, ou seja, no interior de cada um de nós mesmo, através dos agentes componentes do ego. Por isso, é preciso uma didática concreta de dissolução destes eus geradores de defeitos, para ensinar ao homem erradicar do interior de si mesmo o germe dos eus engendradores de todo tipo de violência. É preciso educá-lo com aquela educação que possui a inteligência vegetal, da árvore produz frutos para alimentar não só a si mesma, mas a todos os demais seres vivos da biomassa.
Nesse pensamento, passamos a refletir sobre a violência praticada por policiais no exercício da função. Notadamente, verifica-se que na policia militar do Estado do Rio Grande do Norte, com exceção apenas do Curso de Formação de Oficiais, não há nenhum registro de que o efetivo distribuído em suas respectivas Unidades e Subunidade operacionais, tenham ensinamentos doutrinários dentro da prática de defesa pessoal, que enforque a aspecto da violência e agressividade através de professores devidamente qualificados.
Para essa doutrina, os grandes Mestres das artes marciais do passado nos deixou a doutrina do Budô. Ensinamentos dentro do respeito ao próximo, da disciplina marcial, da ética e da moral. Filosofias doutrinárias para o equilíbrio e controle das ações humanas, não só para os movimentos mecânicos das técnicas de defesa pessoal, mas, para a vida em sociedade. No entanto, essa doutrina não é ensinada pela grande maioria dos professore de artes marciais existentes no mundo atual, doutrina esta que deve ser repassada na prática de defesa pessoal nas organizações policiais, pois, é básica para o controle da violência humana e conseqüentemente, da violência policial tão atual.
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